domingo, 18 de maio de 2014

Jornal Asa Branca: uma chama de liberdade, um vigilante alerta



Capa da 24ª Edição do Jornal Asa Branca (Curaçá-Bahia) - Junho/1982

Sempre que posso, eu leio, releio, faço estudos e análises dos textos, especialmente dos artigos, publicados no extinto Jornal Asa Branca. Através dele, e talvez tão somente por ele, é possível recontar – jornalisticamente falando – parte da história de curaçaense. Como está registrado no livro História da Imprensa de Curaçá, do jornalista Maurízio Bim, o jornal foi o “primeiro veículo de informação do Município”. E eu digo: ele, certamente, foi muito além disso. E sem falsa modéstia, os textos lá publicados são "duma" exímia excelência e permeados de sapiência ímpar.

Fazer jornalismo em Curaçá, ainda que no início dos anos 80 e com a imprensa se consolidando Brasil afora, certamente não foi tarefa fácil. E mesmo se caracterizando como um “jornal político oposicionista”, não há dúvidas (observando as matérias nele publicadas) que ele foi legítimo e que cumpriu o seu papel social. E, como pronunciaram seus editores, o Jornal Asa Branca foi uma “chama de liberdade” e um “grito inconformado ante as condições humilhantes” imposta às pessoas, em tempos difíceis e sufocantes, de governos ditatoriais e birrentos e de gente  afoita querendo afrontá-los.

Na edição nº 2, de 28 de junho de 1980, o colaborador Walter Araújo assinou um texto intitulado “Verdade com democracia”, o qual transcrevo abaixo alguns fragmentos para que façamos algumas reflexões introspectivas.

O primeiro parágrafo do artigo diz o seguinte: “A maneira mais democrática de se fazer jornal, tal como entendemos, deve ser embasada na seriedade de propósitos e da vontade constante e ininterrupta de divulgar a verdade, mesmo que, em consequência, venha se chocar antagonicamente com o interesse daqueles que se inclinam para dentro de si mesmos, ignorando as aspirações, as necessidades, os reclames e as conveniências da coletividade”.

Hoje, 34 anos depois, me inquiro sobre os modos de produção jornalística atuais, especialmente em Curaçá. É claro que os tempos mudaram. E se naquela época o Jornal Asa Branca, mesmo artesanal, datilografado, mimeografado e com tiragem limitada, incomodou por levar a verdade ao povo e estimular debates na sociedade curaçaense, além de ser um “vigilante alerta” e um “denunciador dos problemas que afligiam a comunidade”, imaginem se o fosse esparzido nos dias de hoje, com tantos recursos e possibilidades e com os mesmos objetivos de outrora.

Seria possível produzir uma espécie de “JAB moderno” mesmo com uma juventude alheia ao que acontece na cidade, que se exime da culpa e a joga para os políticos, que se esquiva do prélio e dos movimentos sociais, que não quer mais transcender? Talvez não! Motivos existem, e, assim como as ferramentas para sua produção, “aos montes”, mas lhes falta o desejo de mudança, aquela vontade solene de gritar, de extravasar. E mesmo livre para produzir, parece que a juventude se calou diante do medo. E os jovens atuais se debruçam na ociosidade, na mesmice e na babaquice infinda.

E em tempos que o modo de se fazer jornalismo ganhou formas e ocupou os mais variados espaços – do impresso ao cibernético, do fixo ao móvel, do apurado ao instantâneo, do profissional ao hiperlocal – tenho uma leve impressão de que a imprensa curaçaense ainda está engatilhando. E ainda lhe falta um jornal (rádio, impresso, online ou outro) que seja do povo, feito realmente para o povo. Talvez, caiba a nós, jornalistas curaçaenses, contribuirmos para uma construção desse jornalismo "verdadeiramente democrático". 

Como lição, os convido para refletir sobre o que disse Walter Araújo, no último parágrafo do mesmo artigo citado acima. “Os meios de comunicação e informação devem desenvolver um trabalho plausível, sempre distantes de resquícios partidários, excluída a hipótese de opositores desta ou daquela política. Em outras palavras, vale dizer: independência sem conchavos e livre atuação sem extremismos”.

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